sexta-feira, 12 de junho de 2015

Fichamento do primeiro capitulo da obra A história do Sabor*

       Imagem 1 - ilustração de pinturas em cavernas dos povos pre-históricos


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·         Discutir o gosto alimentar dos povos pré-históricos representa um desafio. Por definição, esses povos não deixaram registros escritos de seus gostos e aversões.
·         Pelos restos de comida é possível demonstrar o que as pessoas comiam, e, pelo descobrimento de itens como lareiras, fornos, panelas e utensílios, é possível ter uma ideia de como a comida era preparada e consumida. Contudo, não é tarefa fácil tentar entender por que as pessoas escolhiam o que comiam e se gostavam do que comiam.
·         Os arqueólogos usam várias linhas de evidencia para estudar esse assunto tão complicado que é o gosto: cultura material, resíduos de comida, evidencia estrutural, contexto ambiental, analogias etnográficas, arte, conhecimento medico e restos mortais em si.

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·         Rebanhos de leite são diferentes de rebanho de corte ou produção de lã, por exemplo. Tais escolhas são influenciadas por questões econômicas e de meio ambiente, mas também por preferencias culturais e alimentares.
·         O abate é uma pratica tão enraizada culturalmente que, até os dias de hoje, revela claramente diferenças regionais e pode se relacionar a costumes da época e gosto em consumo de carne.

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·         O contexto do consumo de alimentos revela muito mais sobre a cultura, os costumes e o paladar.
·         Como saber quais alimentos eram selecionador pelo sabor e quais por necessidade? As duas coisas podem estar fortemente relacionadas. Temos a tendência de desejar o que realmente necessitamos. Por exemplo, temos vontade de comer doces quando necessitamos rapidamente de energia. Contudo, muitos gostos, proibições e costumes podem, na verdade, ser revelados pelas opções alimentares aparentemente ilógicas de certo povo.
·         A cultura ocidental moderna está muito distante do tipo de sociedade existente na pré-história.

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·         Povos “primitivos” recentes e modernos não são povos pré-históricos e não estão preservados em formol. Suas culturas são dinâmicas e influenciadas pelas mudanças circulantes. Ademais, o meio em que as culturas primitivas sobreviventes existem nem sempre é uma boa analogia do passado.
·         O paladar de nossos ancestrais mais antigos pode ter sido muito diferente do nosso.

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·         Em relação a gosto, as implicações são obvias e simples. Os povos pré-históricos tinham estômago para coisas que não comeríamos hoje em dia. Eles comiam com regularidade alimentos que hoje consideraríamos estragados. Pode-se demonstrar que comiam alimentos semiapodrecidos, mas será que apreciavam o sabor? É bem provável que sim. Ao pesquisar a história da domesticação de cavalos no Cazaquistão, este autor conheceu um criador local que lhe ofereceu uma tigela de koumiss, bebida feita de leite de égua fermentado. Para o paladar ocidental moderno, o sabor é bastante repulsivo e provoca todas as reações naturais do corpo à comida estragada. Os cazaques tradicionais o adoram. Perguntamos por que o criador não consumia o leite de égua fresco. A resposta é obvia: eles não tem como conservar o leite fresco em geladeira. Contudo, obviamente nunca havia pensado nisso, e pausou antes de responder que leite fresco não tem gosto algum.


  Imagem 2- representa a extração do leite de égua,
 futuro Koumiss, a bebida tanto apreciada pelos Cazaques

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·         É certo que alguns povos pré-históricos poucos estocavam alimentos, mas também há evidencia de vários métodos de armazenamento, como defumação e secagem.
·         Gosto é uma questão de costume.

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·         O uso inicial de fogo para calor e cozimento é atribuído ao Homo ergaster/erectus. O sitio antigo mais famoso com evidencia do uso de fogo é a caverna de Zhoukoudian, na China, datada entre 500 mil e 240 mil anos atrás. Deixando de lado a biologia evolucionaria, a introdução do cozimento leva nitidamente a discussão de gosto a um novo patamar. Dali em diante, as pessoas não só escolhiam o que comer, mas também como cozinhar a comida. Para o Homo ergaster/erectus essa escolha pode ter se limitado a cru ou bem passado, mas a tecnologia e variedade de métodos de cozimento logo teriam uma influencia tão grande nas decisões de gosto quanto aos ingredientes usados.

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·         Pode-se concluir seguramente que as fontes de gordura eram importantes e muito apreciadas pelos povos pré-históricos.
·         Os caçadores-coletores pré-históricos não só gostavam de gordura como também tinham preferencias por tipos específicos de gordura.
·         Podemos estar certos também de que os caçadores-coletores da pré-história gostavam de doces. Não é atoa que as papilas gustativas para doçura se encontram na ponta da língua. Sua presença ali é uma característica adaptativa de nossa evolução.

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·         Na pré-história, o açúcar viria de frutas e bagas, mel, seiva de bordo e de outros extratos de plantas. É bastante fácil colher bagas que podem ainda ser estocadas depois de secas.
·         A coleta de mel sempre foi bastante arriscada, já que as abelhas são perigosas, principalmente na ausência de roupas apropriadas. É provável que o uso de fumaça para acalmar as abelhas seja uma técnica tradicional.

Imagem 3 - pintura rupestre da gruta da Aranha, em Bicorp (Espanha), 
mostra uma cena de coleta de mel enquanto as abelhas revoam ao redor.


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·         A terra não era a única fonte de nutrição na pré-história. O mar é um fornecedor excepcional de alimentos, incluindo mamíferos marinhos, peixes, moluscos, moluscos, crustáceos e até algas marinhas.

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·         O que está claro é que frutos do mar são apreciados e valorizados há tempos. A exploração de recursos marinhos e costeiros provavelmente desempenhou papel fundamental na colonização pré-histórica de varias partes do mundo.

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·         Conforme a agricultura foi se espalhando, aumentou também a disponibilidade de carboidratos, que além do mais podiam ser estocados para consumo ao longo do ano.
·         Existem alguns lugares no mundo em que as pessoas descobriram, de forma independente, como plantar para comer como Oriente Próximo, América Central e China. Foi no Oriente Próximo, há 10 mil anos, que cereais como trigo e cevada foram domesticados pela primeira vez. Entre 9 e 8 mil anos atrás, alimentos importantes como milho e feijão foram cultivados pela primeira vez na América Central e o arroz na China.
·         Nos centros de domesticação, as versões selvagens das culturas já tinham grande influencia na dieta das pessoas antes do advento da agricultura. Contudo, nas áreas onde a agricultura foi introduzida, esses alimentos seriam uma verdadeira novidade.

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·         No que se refere ao gosto, é interessante saber até que ponto lidamos com agricultores que se mudam e colonizam novas áreas ou com pessoas nativas que adotam novos alimentos e sabores. Os registros arqueológicos indicam nitidamente que ambas as coisas aconteceram, dependendo do local e da época. O que está claro é que alguns grupos adotaram novos alimentos a ponto de excluir outros possíveis recursos.

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·         (Quanto às culturas ocidentais modernas), gostamos de carboidratos e apreciamos ainda mais os doces. Do final do século XIX em diante, o açúcar, refinado tornou-se largamente disponível em grandes quantidades. Nosso gosto por doces nos levou a consumir grandes quantidades de açúcar, paralelamente a uma dieta rica. O resultado é obesidade e diabetes. O gosto pré-histórico por dietas ricas em carboidratos pode ter ocasionado problemas de saúde no passado, mas atualmente estamos diante de situação semelhante.
·         A criação de animais surgiu pouco depois da agricultura. Cabras, ovelhas, gado e porcos foram domesticados no oriente próximo, entre 8 mil e 9 mil anos atrás. Cavalos e camelos-bactrianos foram domesticados na Ásia Central entre 5 mil e 6 mil anos atrás. Aparentemente, os cavalos foram, de inicio, domesticados para alimentação. É provável que galinhas tenham sido domesticadas no Sudeste Asiático por volta de 8 mil anos atrás, seguidas pelos patos cerca de 3 mil anos depois.

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·         A adoção da produção de laticínios está intimamente ligada a uma questão de gosto. Se olharmos as pessoas do mundo de hoje, encontraremos grupos, incluindo muitos do Extremo Oriente e outros em regiões da África, por exemplo, que simplesmente detestam leite. Por trás de tal aversão há um problema digestivo. Eles são intolerantes à lactose, o açúcar do leite, porque não tem habilidade de produzir lactase, a enzima que digere a lactose. O leite, então, lhes provoca náuseas. Entretanto, habitantes do noroeste da Europa e muitos outros grupos tem altos níveis de tolerância a lactose. Isso é claramente uma adaptação evolutiva local. O mais interessante é que todos os nossos primeiros ancestrais tinham intolerância à lactose quando adultos. Os humanos, como muitos outros mamíferos, perde a habilidade de digerir o leite após o desmame. A grande questão é como os humanos superaram esse problema em varias regiões para criar economias baseadas em laticínios. Se todos os humanos tinham aversão natural ao leite, quem foi o primeiro a experimentar ingeri-lo e por quê? Como esses grupos desenvolveram o gosto por uma dieta de laticínio?

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·         É difícil determinar a idade das bebidas lácteas fermentadas, como koumiss (do leite de égua), shubat (do leite de camelo) e kefir (do leite de vaca), mas é bem provável que coincida com as origens da produção de leite em si, pois provavelmente era bem difícil evitar que o leite fermentasse.
·         É impossível saber o que os povos pré-históricos achavam do sabor das bebidas alcóolicas. Hoje em dia é comum dizer que tais bebidas são um gosto “adquirido”, e a tendência é adquiri-lo por razoes sociais. O mesmo pode ser verdade na pré-história.
·         O sal, o mais conhecido de todos os temperos, é muito difícil de ser estudado em termos arqueológicos. Sendo solúvel, tende a não deixar vestígios, e não há meio de identificar seu consumo a partir do estudo de esqueletos humanos; dependemos do descobrimento de lugares onde o sal era produzido. O sal de rocha pode ser minerado, mas o mais comum é a produção de sal pela evaporação da água do mar, de lagos salgados ou de fontes salobras. Em climas adequados, a evaporação solar é possível.

Imagem 4 - Shubat (leite de camelo)

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·         O sal era bastante valioso, mas não se sabe bem o por quê. Além de ser um tempero, era também um conservante. E evidente, contudo, que a comida salgada fazia parte da dieta pré-histórica.
·         É ainda mais difícil avaliar arqueologicamente o uso de ervas e especiarias. Há varias plantas usadas como condimento, muitas até hoje. (...) tabuas de escrita linear B de Micena fornecem algumas das evidencias mais antigas de seu uso. Elas se referem ao uso de sementes de coentro, cominho, funcho, gergelim, aipo, menta e outras ervas e especiarias. É evidente que algumas eram usadas na culinária, mas os registros mostram que também eram empregadas na produção de óleos aromáticos.(...) o uso, no passado, de ervas e especiarias como medicamento é ainda mais complicado. Na maioria das vezes, não há certeza se dada planta era usada como condimento, remédio, conservante, perfume ou como uma combinação desses usos.
·         Muito pouco se sabe sobre receitas pré-históricas. Os ingredientes são conhecidos, mas raramente há evidencias de como eram combinados no preparo dos pratos.

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·         Os banquetes e a alta cozinha são aspectos importantes da atividade social de qualquer sociedade. Os banquetes podem ser usados para demonstrar riqueza e status pelo consumo ostensivo de comida e bebida. Tal demonstração às vezes envolve o consumo de alimentos raros, exóticos ou caros. De outro modo, o status social pode ser demonstrado pela qualidade dos acessórios de mesa. Nesse contexto, o gosto não é simplesmente questão de paladar, mas de moda. Gosto requintado e riqueza para sustenta-lo são, com frequência, marcas de distinção em uma sociedade hierárquica de classes. Os banquetes, com certeza, estão presentes em sociedades de caçadores-coletores.


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·         A maioria dos estudos sobre alimentos pré-históricos concentra-se em aspectos econômicos. Tais estudos tratam de como as pessoas sobreviviam, e, embora esse aspecto seja importante, é evidente que a vida não é apenas sobrevivência. Tendências recentes em pesquisas arqueológicas ressaltam as importantes diferenças entre “comida” e “dieta” e chamam a atenção para o contexto social no qual o alimento é consumido.
·         Algumas questões sobre gosto podem ter sido bastante influenciadas por nosso passado evolucionário ou por nossas necessidades alimentares, enquanto outras foram ditadas pelo ambiente e pela disponibilidade. Não obstante fica claro que existia igualmente na pré-história uma rica variedade de sabores a escolha, e as escolhas eram ditadas por forças sociais. Alimentos e bebidas usados nos banquetes podem ter sido escolhidos pela qualidade, pela natureza exótica ou ainda por suas qualidades inebriantes. O prestigio a mesa poderia resultar de quantidade, raridade, novidade ou moda dos alimentos e utensílios. A religião e os tabus devem ter exercido influencia também. E deveria haver, como hoje em dia, simples gostos e aversões individuais, os mais difíceis de serem estudados.


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*A história do Sabor - Paul Freedman, Organizador; Tradução de Anthony Sean Cleaver – São Paulo; Editora SENAC SÃO PAULO, 2009

Imagem 1 disponivel em: <prehistoria.tumblr.com>. Acesso em 12 jun 2015
Imagem 2 disponivel em:<mw1.google.com> Acesso em 12 jun 2015
Imagem 3 disponivel em: <www.curionautas.com.brAcesso em 12 jun 2015
Imagem 4 disponivel em: <turanasia.kz>Acesso em 12 jun 2015





































*A história do Sabor- Paul Freedman, Organizador; Tradução de Anthony Sean Cleaver – São Paulo; Editora SENAC SÃO PAULO, 2009



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